segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Reflexões ou Revelações II

Depois de ler os comentários ao post abaixo fiquei com a sensação que não fui bem interpretada. Não quis de modo algum passar a imagem da "coitadinha" de quem o pai não gosta. Esta é uma história antiga, diria até, que é a história da minha vida. E é, muito provavelmente, complexa demais para aqui estar exposta em meia dúzia de palavras.
Tenho memória de um pai afectuoso, aí até aos meus 9, 10 anos, a partir desta altura, e sem eu nunca ter percebido porquê, começou a haver um afastamento, afastamento esse, que dura até hoje. A verdade é que, inconscientemente é claro, a partir dessa idade, eu tracei um objectivo: fazer tudo por tudo para o agradar, para o conquistar novamente. E deste modo tornei-me na filha exemplar, aquela que todos os pais gostavam de ter (julgava eu): obediente, submissa, responsável... Nunca chumbei de ano, era uma aluna exemplar, entrei na universidade, conclui o meu curso e arranjei trabalho. Nunca o confrontei, nunca contrariei. Bastava aperceber-me que algo o desagradava para eu deixar de o fazer: não queria que eu saísse à noite, eu não saia e ponto final. Nem ousava pedir. Não concordava com namoros e eu até aos 19 anos não namorei. Se alguma roupa que eu usava lhe desagradava ( por ser mais ousada, segundo os parâmetros dele) eu nunca mais a vestia. E poderia estar aqui a discorrer mais situações semelhantes a estas que este post não teria fim. Nunca o confrontei com as atitudes erradas que tomava comigo, ou com a minha irmã, ou com minha mãe. Nunca o confrontei com o facto de ter amantes, nunca o confrontei nas muitas vezes que lhe abri a porta de casa às 4, 5 e 6 da manhã, depois de ter passado a noite a esbanjar dinheiro em jogos de casino. Fiquei sempre calada. E o que é que eu ganhei com isso? Numa visão optimista, diria que até acabou por ser positivo, pois tornei-me numa pessoa responsável, fiz pela vida, mantive-me afastada de situações que poderiam ter-me sido prejudiciais. Mas numa visão mais realista, não ganhei nada, perdi os melhores anos da minha vida, sinto sempre que a adolescência me foi roubada, não cometi loucuras, nunca conheci os meus limites. As maiores loucuras que cometi, foi ter começado a fumar ( estúpida, eu sei) , ter conhecido o meu marido, ter-me apaixonado perdidamente, e ter começado, sempre às escondidas do meu pai, a namorar com ele. Perdi a auto estima, tornei-me numa pessoa depressiva, medrosa, complexada. E no final de tudo continuei a não sentir qualquer afecto por parte dele, volto a dizer, por mais pequeno que fosse o sinal.
Ao longo da minha vida procurei várias justificações, mas nenhuma me apaziguou a dor. Acreditar que ele não gosta de mim (refiro-me a mim, embora inclua igualmente a minha mana) é, até agora, a que me proporciona mais tranquilidade.

Nesta altura da minha vida, e quase a completar 40 anos, esta é uma questão que para mim está resolvida.
Não sei se será mesmo assim, se calhar estou totalmente enganada, mas neste momento é nisto que acredito.
Porque é não gosta de mim? Não sei, se calhar esta não era a vida que queria, se calhar não queria ter filhos, ou até queria, mas não filhas. Quem sabe se não teria sonhos que, com o casamento e o nascimento das filhas deixou de poder realizar. Não sei responder a esta questão.
E sim, a verdade é que o amor, o afecto, as relações sólidas e profundas fazem muita falta, mesmo muita.

4 comentários:

  1. Acho que te entendi, logo da primeira vez :)

    Gosto muito de ti, sabes disso. És de uma lucidez e verdade impressionantes.

    Beijo grande

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  2. Então acho que assumi-lo é mesmo uma libertação. Porque nunca experimentaste perguntar-lhe directamente?

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  3. Acho que no fundo sabes bem ue essa questão não ficou resolvida dentro de ti... e talvez haja sempre uma pontinha de mágoa, por as coisas não terem sido diferentes. O mesmo acontece comigo, acho que até já arrumei mais ou menos as coisas na minha cabeça, e já me resignei, mas no fundo, no fundinho há sempre uma pontinha de mágoa, que eu acho que nunca vai desaparecer. Ainda assim é possível limpar a cabeça e seguir em frente, é aceitar as coisas como elas são. Mas passar, passar, não passa nunca...

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